Vida e morte natalina

 

_ Caaaaansei ! Chega… Para mim basta! Euzinha aqui?!  Nunquinha mais! _ sapateava feita uma louca, a Morte revoltadíssima.

_ Quer viver?! Que vivaaaaam! Que vivaaaaam para sempre!_ repetia sem parar o mau agouro. Tepeêmeadíssima, a Morte arrumava as malas com destino até então ignorado.

_ Para mim já deu! Alguém tem que fazer o serviço sujo e o que Euzinha ganho?! Reclamação! Reclamação em cima de reclamação! A morte é injusta… A morte é triste… A morte é isto, é aquilo… Pererê parará… chegaaaaaaaa! Morreu! Fui…  Não levo nem mais uma formiguinha que seja. E quer saber?! Coisa mais drag é esqueleto de capa preta e foice! Nãoooo! Vejam o Look daquele um, o tal anjo Gabriel… Cabelinhos cacheados, de asinha e túnica branquinha, cheio de plumas e paetês (Parece mais uma vedete de teatro de revista). E eu?!  Fico na esculhambação?! Nã Na Ni Na Não! Rodei a baiana! Eu quero mais é que todos VIVAAAMM !!

            Naquele ano, o Sistema Único de Saúde havia entrado em colapso total. Ninguém morria. As doenças terminais passaram a ser intermináveis, prolongando a dor e desespero geral. As Unidades de Tratamento Intensivo estavam abarrotadas e os leitos nos hospitais estendiam-se pelos corredores. Aumentou o número de asilos. O que parecia ser um sonho passou agora a ser um pesadelo e, o crescimento demográfico explodiu. Não havia tiro, facada, acidente ou doença que revertesse esse quadro. A morte assumiu o ranking nos Trending Topics e campanhas como #vidaehmorte, #somostodosmorte e #mortevoltesualinda passaram a circular com frequência nas redes sociais. Intransigente e senhora de si, a Morte acompanhava todo movimento. E foi justamente bisbilhotando o facebook do Papai Noel que, comovida, leu o seguinte post em que havia sido marcada:

            Querido Papai Noel… Meu nome é Carlinhos, tenho nove anos e uma doença degenerativa que atrofia-me cada dia mais. Os médicos dizem que é incurável e… Se tenho sido um bom menino este ano, boa parte da responsabilidade é dado a ela, que impossibilita-me de fazer qualquer tipo de travessura. Ahhh como gostaria de fazer travessuras, Papai Noel! Neste momento estou respirando por aparelhos e tenho um único pedido a fazer:_ Leve-me para o Polo Norte com você ou para o céu, por favor?! Eu particularmente aguento as dores e limitações impostas a mim, mas, não suporto mais ver a dor estampada no rosto de meus pais em forma de esperança. Por favor… É a única coisa que peço! PS: sei que não vai me decepcionar, Querido Papai Noel!

            A Morte foi tomada de súbita compaixão. Sabia do seu real papel na Divina Comédia Humana e serena abraçou Carlinhos naquela noite de Natal sem procrastinar. As câmaras de segurança não registraram, mas alguém viu quando Carlinhos, sorridente, foi levado pelas mãos de um imponente enfermeiro desconhecido até desaparecer misteriosamente.

Sandro Ernesto 20/12/2016

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19 Resultados

  1. Adorei, amei e me diverti, obrigado

  2. Bia Perez disse:

    Adorei… Parabéns.Abs.

  3. Maravilhoso♥ Parabéns Sandro!

  4. victorarctic3 disse:

    Gostei bastante. Parabéns.

  5. azurea20 disse:

    Me ha encantado. Que tengas un años lleno de salud y alegría. Un abrazo.

  6. Esse texto é divertido e reflexivo. Muito bom.

  7. obduliono disse:

    Viajei no conto, Sandro! Um abraço!

    • panografias disse:

      Meu querido amigo Obduliono… este conto tem história que nem te conto rsrsrs (como respondi a Cassiane). Apesar de ser um texto divertido, foi escrito sob lágrimas. Fiquei imensamente feliz com a leitura e comentário, meu caro… um forte abraço!

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